segunda-feira, 22 de junho de 2015

ENTRE A CRUZ E A ESPADA

Entre a Cruz e a Espada

Logo que vi a cena da transexual crucificada na última parada gay de São Paulo me senti extremamente ofendido e compartilhei meus sentimentos de modo direto entre um grupo de amigos que imagino também se sentirem ofendidos em menor ou maior grau. Algumas pessoas próximas partiram para o discurso de “não julgar” e concordo com elas, mas minha atitude não foi de julgar a pessoa (aqui se dá a norma negativa), mas julgar o ato praticado. Passado o ponto de ebulição da polêmica, após melhor reflexão e novas informações, me sinto à vontade de escrever a respeito.

Li que a artista se apropriou da imagem como quem expressa sua dor, como quem demonstra sofrer de modo intenso, clamando por misericórdia, respeito e compaixão. Eu me compadeço da dor, me compadeço de seus sofrimentos. Exatamente por essa compaixão convido a todos que se sentiram representados pela imagem iconoclasta a refletir um pouco mais.

A perspectiva teológica da atitude da artista remete à perspectiva do judaísmo que espera por um Cristo libertador das dores humanas, libertador das injustiças temporais, libertador da opressão que esmaga o povo de Deus, que sucumbe a dignidade pela opressão. Assim como é o relato da libertação dos hebreus enquanto escravos no Egito. Neste ponto concordo com a análise feita por Luiz Felipe Pondé em sua coluna na Folha de São Paulo (A linda transexual crucificada), mas discordo quando diz que a artista deu um banho em outros teólogos com sua “teologia performática”, pois Cristo não deu vazão à esperança temporal daqueles que esperavam dar fim às dores que lhes eram impostas pela realidade.

A Cruz de Cristo é carregada de simbologia, em especial o símbolo da dor e o sinal da redenção. Como símbolo da dor é um consolo a todos que sofrem. Como símbolo de redenção é um convite ao caminho que leva ao céu, à verdadeira libertação que não se dá neste mundo: “Meu reino não é deste mundo” (Jo 18, 36).

O convite de Cristo é: “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia e siga-me” (Lc 9, 23) e com base nisso se dá a dimensão da cruz. Cristo convida aqueles que sofrem a tomar seu sofrimento de cada dia em silêncio e o seguir, pois “Foi maltratado, mas livremente humilhou-se e não abriu a boca, como cordeiro conduzido ao matadouro; como ovelha que permanece muda na presença dos tosquiadores ele não abriu a boca” (Is 53, 7). Seguir a Cristo leva a um lugar em comum: morrer pregado na sua própria cruz como caminho (Eu sou o caminho a verdade e a vida [Jo 14, 6]) para a redenção que leva à ressurreição e consequentemente ao céu.

Iluminada por esta Palavra a Igreja conclama aos seus fiéis e convida os homossexuais/transexuais: “[sobre os homossexuais] Devem ser acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza. Evitar-se-á para com eles todo sinal de discriminação injusta. Estas pessoas são chamadas a realizar a vontade de Deus em sua vida e, se forem cristãs, a unir ao sacrifício da cruz do Senhor as dificuldades que podem encontrar por causa de sua condição” (CIC 2358 – grifo meu).


Me compadeço da dor da artista e a convido a entregar suas dores nas mãos de Cristo para que Ele a ajude a carregar a sua cruz, e, que busque sempre realizar a vontade de Deus em sua vida. E, por amor, corrijo sua atitude que foi desconexa e inapropriada, pois carece de sentido teológico e aparenta (para muitos, inclusive a mim a primeira vista) um oportunismo sobre o sentimentalismo alheio que pode sair pela culatra visto que em outras oportunidades, como na JMJ 2013 no Rio de Janeiro, símbolos cristãos foram utilizados simplesmente para provocar e denegrir a fé alheia.


R. B. Figueiredo