Por
que dizer não à Liberdade na Educação? Ou: Liberdade, Subsidiariedade e a
Questão da Educação
Todas as pessoas em “CNTP” (condições normais
de temperatura e pressão) desejam a liberdade seja para si ou para o próximo,
em especial as pessoas de bem compartilham efusivamente desse desejo. No
entanto é cada vez mais comum perceber a negação da liberdade individual em
nome de uma “autoridade” de modo consciente ou inconsciente. A liberdade só é
liberdade quando o indivíduo tem a faculdade de escolha, quando ele pode
analisar suas capacidades e decidir se é capaz, se é prudente, se é conveniente
executar uma ação, uma escolha. Toda liberdade exige do indivíduo
responsabilidade e dedicação, como diria Ben Parker: “Com grandes poderes vêm
grandes responsabilidades.” (Homem Aranha de Stan Lee, 15º Vol. Amazing Fantasy, 1962). Pode parecer
piada usar uma frase de um quadrinho famoso, mas ela ilustra bem a consequência
fundamental da liberdade: a responsabilidade.
Um dos princípios da liberdade individual é a
subsidiariedade que consiste em uma escala de ação que começa no indivíduo e
vai até, em último caso, à instância máxima de um Estado ou de uma organização
superior. Portanto é dar ao indivíduo a faculdade de executar e resolver seus
desejos, projetos, problemas; caso não tenha a capacidade ou julgue não ser
prudente ele poderá solicitar ajuda de outro. Para se compreender melhor a
respeito da subsidiariedade aconselho a leitura deste artigo do
Professor Ubiratan J. Iorio[i],
o professor exemplifica:
“Se você tiver um problema
com o seu vizinho de porta, o ideal é resolvê-lo sem recorrer ao síndico. Se a
questão é no condomínio, o correto é levá-la ao síndico e não à administração
regional de seu bairro. Se o problema for do bairro, melhor recorrer à
administração e não à prefeitura. Caso seja da cidade, para que recorrer ao
governador, se existe a figura do prefeito, que ganha para isso? Da mesma
forma, se as dificuldades são em um Estado, deve-se buscar o governador e não o
presidente do país.”.
Ora, para se garantir a liberdade é preciso estar
em comunhão com o princípio da subsidiariedade.
Ao se considerar a diversidade e peculiaridade de
cada indivíduo, qualquer pessoa em sã consciência consegue chegar à conclusão
de que a instrução individual é absolutamente superior a uma instrução
coletiva. Em uma sociedade livre e justa – com base na liberdade e no princípio
da subsidiariedade – a conclusão de que a Educação Domiciliar (homeschooling) é uma excelente opção se
torna óbvia. Também se torna claro que a
imposição de um molde como: carga horária, período, temporalidade, didática e
conteúdo é uma violência, uma agressão à pessoa. Como diria Murray N. Rothbard[ii]:
“Visto que cada
pessoa é um indivíduo único, fica claro que o melhor tipo de instrução formal é
aquele tipo que é adequado para sua própria individualidade. Cada criança
possui inteligência, aptidões e interesses diferentes. Portanto, a melhor
escolha do ritmo, calendário, variedade, forma e dos cursos de instrução irá
diferir de uma criança para outra.
[...]
É óbvio,
portanto, que o melhor tipo de instrução é a instrução individual. Um curso no
qual um professor instrui um pupilo é claramente, de longe, o melhor tipo de
curso. É somente sob tais condições que as potencialidades humanas podem
desenvolver em seus mais altos níveis. É claro que a escola formal,
caracterizada por aulas nas quais um professor instrui muitas crianças, é um
sistema imensamente inferior. Visto que cada criança difere das outras em
interesses e habilidades, e o professor só pode ensinar uma coisa de cada vez,
é evidente que cada sala de aula deve converter toda a instrução em um molde uniforme.
Independente do modo como o professor instrui, com qual ritmo, calendário ou
variedade, ele está praticando um abuso com todas as crianças. Qualquer
escolaridade envolve inapropriadamente estirar cada criança na cama procusteana da uniformidade incompatível”.
Partindo da perspectiva em que se busca o melhor para o
desenvolvimento da pessoa, uma conduta personalista em que se respeita o
indivíduo, o princípio da subsidiariedade deve ser aplicado para que se possa
ter uma sociedade livre e justa. Assim, a responsabilidade pela educação das
crianças paira sobre os pais – que são os mais interessados no desenvolvimento
de seus filhos.
Considerando que os pais são os primeiros educadores, desde
o desenvolvimento embrionário, deve ser dado às famílias o direito de escolher
como será a educação formal. Quando eles não são capazes de executar essa
tarefa (falta de tempo, capacidade intelectual) devem, então, contratar um
tutor e se não tiverem condições financeiras devem contratar uma escola privada
que (analisada pelos pais) seja compatível com as necessidades de seus filhos,
pois temos na sociedade diversos níveis de alunos. As escolas buscariam
oferecer modos diferentes de tutoria e assim diminuiria a agressão imposta ao
indivíduo. Concluí-se, claramente, que uma definição metodológica que venha do
Estado, de cima para baixo, é um abuso, uma opressão, uma tirania, um
cerceamento da liberdade.
Poderia se questionar: como as famílias que não têm
condições para oferecer ou contratar os serviços de um tutor ou uma escola
privada deveriam proceder? Nesse caso seria uma solução viável o método dos vouchers (sugerido por Milton Friedman
em 1955). O voucher é uma espécie de
bolsa de estudos em que o poder público paga os estudos dos alunos, porém,
diferente do bolsa escola. A idéia é basicamente a seguinte: separar o papel do
governo como financiador da educação de seu papel de administrador do sistema
educacional. Esse modelo é aplicado na Suécia, Chile, EUA e tem variâncias em cada localidade. Segue um artigo.
De onde surgiu a Educação Obrigatória Moderna? A história
revela que seu início tem origem nos reformadores Lutero (1524) e Calvino (1536),
com ideais despóticos e totalitários. Adotada pela Prússia, com início em 1643 de
forma regionalizada. Em 1717 foi inaugurado na Prússia o primeiro sistema de
ensino estatal a nível nacional da Europa pelo Rei Frederico Guilherme I. Na
França, veio com a Revolução Francesa: a Constituição Revolucionária de 1791
decretou instrução primária obrigatória para todos.
O que há de comum nas incursões dessa metodologia? Ações de
totalitarismo e potencialidade de doutrinação como, por exemplo, a
uniformização lingüística dominante, corpo docente formado pelas escolas
normais do Estado, aplicações de exames de graduação para ser capaz de impor um
controle estatal sobre todas as escolas. O primeiro passo era a obrigatoriedade
da frequência nas escolas estatais e o não cumprimento era punido com multas ou
até mesmo com a perda da guarda dos filhos. Conseqüentemente as escolas
privadas foram eliminadas em alguns países e só puderam reaparecer quando se
submetiam à cartilha imposta pelo Estado. Havia perseguição à Igreja Católica e
seus métodos de Educação Livre, a partir das ideias de Lutero e Calvino e assim
se espalhou, exceto quando o governo local ainda não tinha força ou condições
suficiente para expulsar ou substituir as escolas Católicas de seus territórios.
Esses fatos podem ser encontrados no livro “Educação: Livre e Obrigatória” de
Murray N. Rothbard e outros por ele citado como: Fraz de Hovre, German and English Education; Otto
Hintze (et al.), Modern Germany in
Relation to the Great War; C.f. Carlton Joseph Huntley Hayes, A political and cultural history of modern
Europe; Hebert Spencer, Social
Statics; e outros.
Qual a importância da origem histórica? Perceber que o
modelo atual é um método, de origem opressora, enraizado como fundamental no
inconsciente coletivo. Máquina de difusão adotada para plantar ideologias na
sociedade. Necessária para a implantação de regimes totalitários como Nazismo,
Fascismo e Comunismo.
No Brasil isso é bem claro. É praticamente consensual a
aversão à ideia da Educação Domiciliar, principalmente quando não houve nenhuma
leitura a respeito, e percebe-se a negação à liberdade individual em nome de
uma “autoridade”, o Estado e sua determinação de como deve ser a Educação no
país. Usurpa-se a autoridade das famílias sobre a educação dos filhos.
A educação no Brasil tem um objetivo claro: alcançar índices
estatísticos. X% de alunos nas escolas; Y% de analfabetismo; Z% da população
com ensino superior. Entretanto o que mais aparece são os “analfabetos
funcionais”. Uma grande parcela dos alunos secundaristas não consegue fazer uma
leitura em voz alta, respeitando a pontuação, pronúncia e sequência lógica da
frase. Ler e interpretar um texto é uma tarefa extremamente difícil para
muitos. Isso não se restringe aos alunos de escolas públicas e se estende a muitos
universitários. Sem contar como bem intitulou Rodrigo Constantino[iii]
em seu artigo: a "Cultura
Bacharelesca",
sobre a supervalorização no Brasil da obtenção do diploma de nível superior.
Temos um sistema educacional intervencionista, ineficiente e falido. E não se
admite por parte de muitos “educadores” a busca pela abertura a novos métodos
como a Educação Domiciliar. Percebe-se que a tendência é mais intervencionismo
como o sistema de entrada nas universidades através do Enem. Adota-se cada vez
mais o modelo Prussiano.
As opiniões contrárias
à Educação Domiciliar no Brasil são em regra as mesmas: dificuldade de
fiscalização desse modelo que pode acarretar em negligencia e abandono
intelectual, e, principalmente, à socialização que alguns defendem só ser possível
na escola. Como demonstra este artigo do Professor Luis
Carlos de Menezes[iv]
e o debate entre especialistas como nesta reportagem¹ ou reportagem². O Advogado Edison
Prado de Andrade[v]
se posiciona:
E a socialização?
“É um ponto central. Alguns especialistas alegam que a criança, só em
casa, não se socializaria. Dizem que precisa de um ambiente maior, que a
família é apenas a instituição na qual se dá a educação primária, e a escola é
tradicionalmente o lugar da socialização secundária. Discordo. As evidências
comprovam que a escola é um lugar de socialização deficiente. Os filhos, muitas
vezes, chegam lá e sofrem bullying, e
isso traz problemas para a formação da personalidade. Existem outros espaços
que as crianças podem fazer amigos e aprender a conviver com as diferenças.
Elas vão ao parque, à igreja, ao museu. Conhecem pessoas da vizinhança, tudo de
forma equilibrada, com acompanhamento dos pais”.
Evidente que não se pode permitir a negligencia e o
abandono intelectual. Ademais os outros argumentos contrários à liberação da
opção pela Educação Domiciliar são, praticamente, os mesmos argumentos utilizados
para a obrigatoriedade instalada na Prússia. Quase sempre maquiados com o ideal
de estabelecer uma nação uniforme, homogênea e igualitária. Enquanto isso,
famílias como a Bueno que decidem optar pela responsabilidade da educação
dos filhos são marginalizadas injustamente pela Lei.
A questão não é o fim das escolas, mas que possam
elaborar seus currículos de forma livre, com metodologias diferentes umas das
outras para formar pessoas com a alegria do aprender, com o desejo do
conhecimento, e não alunos obcecados por “passar de ano”. Assim os pais podem
ter a liberdade de escolher uma escola que tem os princípios e ideais alinhados
com o seus, e, adequados com as necessidades de cada criança. Quando os pais tiverem
a capacidade de fornecer por si mesmos, por que não optar pelo homeschooling? Por que dizer não à Liberdade
na Educação?
Portanto, o fato é que a imposição de um modelo único
de educação orientado de cima para baixo pelo Estado é a negação do princípio
da subsidiariedade e da liberdade, além de ser a afirmação de um Estado
totalitário intervencionista em contraposição a uma sociedade livre e justa.
R. B. Figueiredo
[i]IORIO, Ubiratan J.; Professor da Faculdade de Ciências Econômicas
da UERJ; Diretor Acadêmico do Instituto Ludwig von Mises Brasil - IMB; CEO do
CIEEP.
[ii]ROTHBARD, Murray N.;
Educação: Livre e Obrigatória – São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil,
2013.
[iii]CONSTANTINO, Rodrigo; Membro-fundador do Instituto Millenium e Presidente do
Instituto Liberal.
[v]ANDRADE, Edson Prado
de; Mestre em educação e doutorando com a tese “Educação familiar
desescolarizada como um direito da criança e do adolescente”, ambos pela
Universidade de São Paulo – USP; em entrevista para o Correio Braziliense.