quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Por que dizer não à Liberdade na Educação? Ou: Liberdade, Subsidiariedade e a Questão da Educação

Por que dizer não à Liberdade na Educação? Ou: Liberdade, Subsidiariedade e a Questão da Educação


Todas as pessoas em “CNTP” (condições normais de temperatura e pressão) desejam a liberdade seja para si ou para o próximo, em especial as pessoas de bem compartilham efusivamente desse desejo. No entanto é cada vez mais comum perceber a negação da liberdade individual em nome de uma “autoridade” de modo consciente ou inconsciente. A liberdade só é liberdade quando o indivíduo tem a faculdade de escolha, quando ele pode analisar suas capacidades e decidir se é capaz, se é prudente, se é conveniente executar uma ação, uma escolha. Toda liberdade exige do indivíduo responsabilidade e dedicação, como diria Ben Parker: “Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades.” (Homem Aranha de Stan Lee, 15º Vol. Amazing Fantasy, 1962). Pode parecer piada usar uma frase de um quadrinho famoso, mas ela ilustra bem a consequência fundamental da liberdade: a responsabilidade.

Um dos princípios da liberdade individual é a subsidiariedade que consiste em uma escala de ação que começa no indivíduo e vai até, em último caso, à instância máxima de um Estado ou de uma organização superior. Portanto é dar ao indivíduo a faculdade de executar e resolver seus desejos, projetos, problemas; caso não tenha a capacidade ou julgue não ser prudente ele poderá solicitar ajuda de outro. Para se compreender melhor a respeito da subsidiariedade aconselho a leitura deste artigo do Professor Ubiratan J. Iorio[i], o professor exemplifica:

Se você tiver um problema com o seu vizinho de porta, o ideal é resolvê-lo sem recorrer ao síndico. Se a questão é no condomínio, o correto é levá-la ao síndico e não à administração regional de seu bairro. Se o problema for do bairro, melhor recorrer à administração e não à prefeitura. Caso seja da cidade, para que recorrer ao governador, se existe a figura do prefeito, que ganha para isso? Da mesma forma, se as dificuldades são em um Estado, deve-se buscar o governador e não o presidente do país.”.

Ora, para se garantir a liberdade é preciso estar em comunhão com o princípio da subsidiariedade.

Ao se considerar a diversidade e peculiaridade de cada indivíduo, qualquer pessoa em sã consciência consegue chegar à conclusão de que a instrução individual é absolutamente superior a uma instrução coletiva. Em uma sociedade livre e justa – com base na liberdade e no princípio da subsidiariedade – a conclusão de que a Educação Domiciliar (homeschooling) é uma excelente opção se torna óbvia.  Também se torna claro que a imposição de um molde como: carga horária, período, temporalidade, didática e conteúdo é uma violência, uma agressão à pessoa. Como diria Murray N. Rothbard[ii]:

Visto que cada pessoa é um indivíduo único, fica claro que o melhor tipo de instrução formal é aquele tipo que é adequado para sua própria individualidade. Cada criança possui inteligência, aptidões e interesses diferentes. Portanto, a melhor escolha do ritmo, calendário, variedade, forma e dos cursos de instrução irá diferir de uma criança para outra.

[...]

É óbvio, portanto, que o melhor tipo de instrução é a instrução individual. Um curso no qual um professor instrui um pupilo é claramente, de longe, o melhor tipo de curso. É somente sob tais condições que as potencialidades humanas podem desenvolver em seus mais altos níveis. É claro que a escola formal, caracterizada por aulas nas quais um professor instrui muitas crianças, é um sistema imensamente inferior. Visto que cada criança difere das outras em interesses e habilidades, e o professor só pode ensinar uma coisa de cada vez, é evidente que cada sala de aula deve converter toda a instrução em um molde uniforme. Independente do modo como o professor instrui, com qual ritmo, calendário ou variedade, ele está praticando um abuso com todas as crianças. Qualquer escolaridade envolve inapropriadamente estirar cada criança na cama procusteana da uniformidade incompatível”.

Partindo da perspectiva em que se busca o melhor para o desenvolvimento da pessoa, uma conduta personalista em que se respeita o indivíduo, o princípio da subsidiariedade deve ser aplicado para que se possa ter uma sociedade livre e justa. Assim, a responsabilidade pela educação das crianças paira sobre os pais – que são os mais interessados no desenvolvimento de seus filhos.

Considerando que os pais são os primeiros educadores, desde o desenvolvimento embrionário, deve ser dado às famílias o direito de escolher como será a educação formal. Quando eles não são capazes de executar essa tarefa (falta de tempo, capacidade intelectual) devem, então, contratar um tutor e se não tiverem condições financeiras devem contratar uma escola privada que (analisada pelos pais) seja compatível com as necessidades de seus filhos, pois temos na sociedade diversos níveis de alunos. As escolas buscariam oferecer modos diferentes de tutoria e assim diminuiria a agressão imposta ao indivíduo. Concluí-se, claramente, que uma definição metodológica que venha do Estado, de cima para baixo, é um abuso, uma opressão, uma tirania, um cerceamento da liberdade.

Poderia se questionar: como as famílias que não têm condições para oferecer ou contratar os serviços de um tutor ou uma escola privada deveriam proceder? Nesse caso seria uma solução viável o método dos vouchers (sugerido por Milton Friedman em 1955). O voucher é uma espécie de bolsa de estudos em que o poder público paga os estudos dos alunos, porém, diferente do bolsa escola. A idéia é basicamente a seguinte: separar o papel do governo como financiador da educação de seu papel de administrador do sistema educacional.  Esse modelo é aplicado na Suécia, Chile, EUA e tem variâncias em cada localidade. Segue um artigo.

De onde surgiu a Educação Obrigatória Moderna? A história revela que seu início tem origem nos reformadores Lutero (1524) e Calvino (1536), com ideais despóticos e totalitários. Adotada pela Prússia, com início em 1643 de forma regionalizada. Em 1717 foi inaugurado na Prússia o primeiro sistema de ensino estatal a nível nacional da Europa pelo Rei Frederico Guilherme I. Na França, veio com a Revolução Francesa: a Constituição Revolucionária de 1791 decretou instrução primária obrigatória para todos.

O que há de comum nas incursões dessa metodologia? Ações de totalitarismo e potencialidade de doutrinação como, por exemplo, a uniformização lingüística dominante, corpo docente formado pelas escolas normais do Estado, aplicações de exames de graduação para ser capaz de impor um controle estatal sobre todas as escolas. O primeiro passo era a obrigatoriedade da frequência nas escolas estatais e o não cumprimento era punido com multas ou até mesmo com a perda da guarda dos filhos. Conseqüentemente as escolas privadas foram eliminadas em alguns países e só puderam reaparecer quando se submetiam à cartilha imposta pelo Estado. Havia perseguição à Igreja Católica e seus métodos de Educação Livre, a partir das ideias de Lutero e Calvino e assim se espalhou, exceto quando o governo local ainda não tinha força ou condições suficiente para expulsar ou substituir as escolas Católicas de seus territórios. Esses fatos podem ser encontrados no livro “Educação: Livre e Obrigatória” de Murray N. Rothbard e outros por ele citado como: Fraz de Hovre, German and English Education; Otto Hintze (et al.), Modern Germany in Relation to the Great War; C.f. Carlton Joseph Huntley Hayes, A political and cultural history of modern Europe; Hebert Spencer, Social Statics; e outros.

Qual a importância da origem histórica? Perceber que o modelo atual é um método, de origem opressora, enraizado como fundamental no inconsciente coletivo. Máquina de difusão adotada para plantar ideologias na sociedade. Necessária para a implantação de regimes totalitários como Nazismo, Fascismo e Comunismo.

No Brasil isso é bem claro. É praticamente consensual a aversão à ideia da Educação Domiciliar, principalmente quando não houve nenhuma leitura a respeito, e percebe-se a negação à liberdade individual em nome de uma “autoridade”, o Estado e sua determinação de como deve ser a Educação no país. Usurpa-se a autoridade das famílias sobre a educação dos filhos.

A educação no Brasil tem um objetivo claro: alcançar índices estatísticos. X% de alunos nas escolas; Y% de analfabetismo; Z% da população com ensino superior. Entretanto o que mais aparece são os “analfabetos funcionais”. Uma grande parcela dos alunos secundaristas não consegue fazer uma leitura em voz alta, respeitando a pontuação, pronúncia e sequência lógica da frase. Ler e interpretar um texto é uma tarefa extremamente difícil para muitos. Isso não se restringe aos alunos de escolas públicas e se estende a muitos universitários. Sem contar como bem intitulou Rodrigo Constantino[iii] em seu artigo: a  "Cultura Bacharelesca", sobre a supervalorização no Brasil da obtenção do diploma de nível superior. Temos um sistema educacional intervencionista, ineficiente e falido. E não se admite por parte de muitos “educadores” a busca pela abertura a novos métodos como a Educação Domiciliar. Percebe-se que a tendência é mais intervencionismo como o sistema de entrada nas universidades através do Enem. Adota-se cada vez mais o modelo Prussiano.

As opiniões contrárias à Educação Domiciliar no Brasil são em regra as mesmas: dificuldade de fiscalização desse modelo que pode acarretar em negligencia e abandono intelectual, e, principalmente, à socialização que alguns defendem só ser possível na escola. Como demonstra este artigo do Professor Luis Carlos de Menezes[iv] e o debate entre especialistas como nesta reportagem¹ ou reportagem². O Advogado Edison Prado de Andrade[v] se posiciona:

E a socialização?

“É um ponto central. Alguns especialistas alegam que a criança, só em casa, não se socializaria. Dizem que precisa de um ambiente maior, que a família é apenas a instituição na qual se dá a educação primária, e a escola é tradicionalmente o lugar da socialização secundária. Discordo. As evidências comprovam que a escola é um lugar de socialização deficiente. Os filhos, muitas vezes, chegam lá e sofrem bullying, e isso traz problemas para a formação da personalidade. Existem outros espaços que as crianças podem fazer amigos e aprender a conviver com as diferenças. Elas vão ao parque, à igreja, ao museu. Conhecem pessoas da vizinhança, tudo de forma equilibrada, com acompanhamento dos pais”.

Evidente que não se pode permitir a negligencia e o abandono intelectual. Ademais os outros argumentos contrários à liberação da opção pela Educação Domiciliar são, praticamente, os mesmos argumentos utilizados para a obrigatoriedade instalada na Prússia. Quase sempre maquiados com o ideal de estabelecer uma nação uniforme, homogênea e igualitária. Enquanto isso, famílias como a Bueno que decidem optar pela responsabilidade da educação dos filhos são marginalizadas injustamente pela Lei.

A questão não é o fim das escolas, mas que possam elaborar seus currículos de forma livre, com metodologias diferentes umas das outras para formar pessoas com a alegria do aprender, com o desejo do conhecimento, e não alunos obcecados por “passar de ano”. Assim os pais podem ter a liberdade de escolher uma escola que tem os princípios e ideais alinhados com o seus, e, adequados com as necessidades de cada criança. Quando os pais tiverem a capacidade de fornecer por si mesmos, por que não optar pelo homeschooling? Por que dizer não à Liberdade na Educação?

Portanto, o fato é que a imposição de um modelo único de educação orientado de cima para baixo pelo Estado é a negação do princípio da subsidiariedade e da liberdade, além de ser a afirmação de um Estado totalitário intervencionista em contraposição a uma sociedade livre e justa.


R. B. Figueiredo




[i]IORIO, Ubiratan J.; Professor da Faculdade de Ciências Econômicas da UERJ; Diretor Acadêmico do Instituto Ludwig von Mises Brasil - IMB; CEO do CIEEP.

[ii]ROTHBARD, Murray N.; Educação: Livre e Obrigatória – São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2013.

[iii]CONSTANTINO, Rodrigo; Membro-fundador do Instituto Millenium e Presidente do Instituto Liberal.

[iv]MENEZES, Luiz Carlos de; Físico e Educador da Universidade de São Paulo – USP.

[v]ANDRADE, Edson Prado de; Mestre em educação e doutorando com a tese “Educação familiar desescolarizada como um direito da criança e do adolescente”, ambos pela Universidade de São Paulo – USP; em entrevista para o Correio Braziliense.